Crítica: Universidade Monstros


Não precisa comparar Universidade Monstros (Monsters University, 2013) com os antigos trabalhos da Pixar para concluir os méritos desse filme. Está bem claro que o que esse estúdio de animação já produziu em caráter de qualidade técnica e inovação conceitual está muito, muito a frente do que já fizeram suas concorrentes diretas no filão de blockbusters. Nesse último trabalho é bem fácil perceber a eficiência do filme, iniciando por uma proposta infinitamente clara. O resultado é um filme-família típico, que nem por isso merece ser ignorado, vale sim uma boa conferida.

Aliás, de tom conceitual, o "universo" proposto desde Monstros S.A. já é bem definido, flertando com uma visão romantizada e menos temerosa à visão que temos dos monstros. Talvez seja válido compreender que do mesmo modo como atores e diretores tem a liberdade de "aliviar" suas escolhas com trabalhos mais brandos e menos rigorosos, a Pixar também pode assim escolher. Tratando daquele que provavelmente é o único tom profundo abordado nos monstros, os resultados em ambos os filmes ainda assim são bem favoráveis à uma linguagem que condiz com seus espectadores.

Obviamente direcionado ao público infantil, porém também nada distante dos adultos, o filme não mostra-se carregado ou pesado para seu acompanhamento, contudo mesmo para as crianças é possível compreender que os monstros podem ser encarados não somente como um bicho-papão atrás do armário.

A seu modo, consequentemente emergem pequenas filosofias, ou pequenos convites à perguntas, dúvidas, incômodos psicológicos da visão maldosa que alimentamos do universo dos monstros. Uma vez plantada essa semente, se encerra neste quesito conceitual o que o público pode sugar por trás desses filmes.

Universidade Monstros é um prequel, cumprindo bem a missão de contar o início da trajetória de Mike Wazowski e Sullivan. Agora eles estão na Universidade, enfrentando as dificuldades para tornar-se um monstro gabaritado, capaz de assustar as crianças a conseguir energia para a cidade. Igualando-os em simpatia, a dependência um do outro é facilmente percebida nas cenas onde somente um deles é o centro narrativo. A construção dessa ideia parte do próprio mote explicativo da jornada, onde a interdependência de ambos fortalece primeiramente a aliança para posteriormente começar a florescer a amizade.



A construção dos elos simpáticos do filme são simplórios, estão longe de arriscar em inovação mesmo para os protagonistas, flertando com o objetivo de não correr o risco de errar e entregando-se ao senso comum de amizade e superação. A história fica batida, simples demais e entregue à previsão, no entanto não há alternância de interesses na trama, pois mais superficial que seja ainda assim é equilibrada e consciente de sua escolha. Àquele público desprovido de altura, certamente tudo isso está longe de ser posto em xeque, induzidos pela força caricata que amarra o filme.

É partindo deste princípio que ficar aguardando altas inovações narrativas em qualquer filme do estúdio nada mais é que a própria inocência dos adultos. Exigir da Pixar unicamente a evolução conceitual é um fardo que eles mesmos construíram diante de tantas obras máximas de animação produzidas em pouco espaço de tempo.

O cenário é favorável à uma leitura simples do momento dessas produções, com um público definido e ansiando fazer-se chorar por mais uma linda história, mal acostumado pela excelência e disposto a criticar infindavelmente àqueles que os entregaram um conceito novo de animação, o inacreditável elo entre linguagem popular americana, Disney, infantilidade e qualidade conceitual proposta a adultos.

Fora as animações orientais e europeias que demarcam-se por selos autorais, a Pixar despontou-se como única fonte de qualidade popular e inovadora ao mesmo tempo, o que resume seu crescimento acentuado e um público mesclado em interesses. Desde a produção de Toy Story 3, a última grande obra-prima, o estúdio começa a depositar em si a desconfiança que antes era quase indestrutível. Universidade Monstros, por se tratar de um gancho de uma história já existente, foge um pouco à esta premissa de incapacidade artística, e acumula aplausos esperançosos com críticas impacientes para uma história rasa mas ainda com qualidades bem perceptíveis.



No que tange estes aplausos e críticas, assim, destaca-se favoravelmente mais um belo trabalho de animação de arte, despontado em cores vivas e diversificadas que propõem a visão infantil da história. Salda-se bem agradável o apelo visual, mantendo em alto nível a atenção por detalhes nas cenas, fator muito marcante nos filmes do estúdio. Salvo a diferença de 12 anos de Monstros S.A. para Universidade Monstros, o trabalho técnico deste novo trabalho é absurdamente melhor que o anterior, em especial ao trabalho sobre a personagem de Sullivan, com seus infinitos pelos trabalhados com enorme paciência.

E por que o filme é simples? Pois os nichos construtivos não são inovadores, os protagonistas Mike e Sullivan são construídos em apelo simpático por serem caricatos demais, cheios de facetas. É claramente dividido entre os grupos bons e maus, decidindo a quem temos que torcer predispondo-se a mostrar os destinos certos de cada um. O restante dos personagens, exceto a diretora Hardscrabble, compõe o elenco somente em número. Somados vários pontos que atendem bem ao selo de clichê, acaba por se caracterizar como filme de verão.

Se mudarmos o ângulo de visão deste filme, deixando de buscar profundidade em tudo e aceitando a condição de criança, por mais que as lições de moral sobre união, importância das diferenças, o não aceite à incapacidade das tarefas e tudo mais, é bem possível encontrar apego aos personagens e entender sem arrogância que a proposta foi bem cumprida.


O grande problema surge quando pensamos que somos incapazes de achar graça com algo tosco, ser um idiota por um dia, errar um monte, e pior, consciente da babaquice, mas feliz da vida. Universidade Monstros não se enquadra neste filão, mas isso conceitua a brecha para a aceitação do simples. Mas não, nunca somos assim porque estamos sempre vestidos em nosso sobretudo, com um chapéu misterioso e fumando um charuto ao longe, observando o mundo com nosso infinito senso crítico para transformar tudo em belas análises cruas e secas. Ser idiota não pode ser regra, mas sê-lo de vez em quando pode nos mostrar que nem sempre o simples é tão vago quanto parece.




 

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