Crítica: Um Conto Chinês


É notável a ascensão da produção do cinema argentino. Também é fácil perceber que Ricardo Darín tornou-se o “queridinho” dos filmes sul-americanos. Sem páreo para rivalizar, é natural hoje em dia elevar o status da importância das produções de nosso país vizinho. Esse atual pensamento é, antes de tudo, um prêmio, uma resposta ao notável trabalho que por lá se faz; e cita-se, como maior exemplo, o grandioso O Segredo dos Seus Olhos, ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2010.

Pois bem, essas colocações só servem para contextualizar o cenário atual das produções cinematográficas sul-americanas e, principalmente, atentar àqueles que ainda desviam seus olhos e insistem em tentar encontrar pérolas – quase que – inexistentes no cinema tupiniquim.

Ricardo Darín é mesmo talentoso, e já desdobra em seu currículo papéis centralizados nas maiores obras do cinema local, fato este que o torna respeitado e notado aqui no continente. Essas atuações, ao que parece, começam a demarcar uma época, um período relevante para o frágil currículo do cinema local (se comparado às americanas e europeias).

Uma virtude percebida e desenvolvida por lá é a habilidade de falar vários “idiomas narrativos”. Tornou-se rotineiro presenciar histórias que insistem em fugir do lugar-comum, típico de cinema pobre, sem capacidade de desenvolver uma linguagem concisa para qualquer roteiro que seja, algo que o cinema brasileiro (e é difícil não comparar) ora ou outra opta por fazer, mas geralmente cai no lugar-comum.

Desse modo, encontramos chão para analisar em que nível se encontra Um Conto Chinês (Un Cuento Chino, 2011), dirigido por Sebastián Borensztein, baseado em fatos reais e estrelado pelo já citado Ricardo Darín. Partindo de uma premissa incomum, o “prólogo” (se é que assim pode-se dizer) estabelece uma situação de constrangimento, algo que já na primeira cena opta por chocar e quebrar estereótipos narrativos. Em uma localidade chinesa, uma vaca cai do céu e afunda parte de um barco, onde um chinês pediria sua esposa em casamento.

Um Conto Chinês se propõe a narrar a história de Roberto, cidadão argentino, dono de uma loja de ferragens, fechado, sisudo, mesquinha e amargurado, daquele tipo que quase paga para não sorrir. Essas características dão a ele uma personalidade envolvente e movem o interesse em se apegar à persona do rapaz.

O mote dessa história se dará em encaixar a relação do cotidiano monótono desse solitário rapaz argentino com a chegada de um imigrante chinês. O chinês não entende espanhol, e o argentino não sabe chinês. Com isso, as situações de constrangimento se agravam, e se estabelece mais uma ferramenta comunicativa para a comédia fluir sem restrição. Contando com um simpaticíssimo ritmo narrativo, os diálogos entre os personagens centrais se deixam trocar por situações inusitadas, de gestos e mímicas intencionadas em uma urgente troca de informações. É importante perceber, ainda, a importância que o ar carrancudo do personagem de Darín dá para a construção de cenas que quase se ausentam de diálogos, mas mesmo assim possuem forte poder de comunicação e importância para a construção da trama. Os recorrentes palavrões de Roberto diante de sua não satisfação com o convívio do chinês em sua casa são o alívio cômico de incontáveis cenas.



Sem meias-palavras, o filme se descobre numa bela habilidade em persuadir o espectador. Simples e ponderado, o ritmo adotado em Um Conto Chinês é tão bem investido que seria possível assisti-lo sem cansar até mesmo numa extensão bem mais acentuada. Para isso, sua trilha sonora tem papel crucial em desenvolver essa sensibilidade narrativa.

É daqueles filmes que de início já nos prende a querer saber o que vai acontecer, e daí já se percebe outra grande capacidade de comunicação com o espectador, e, sem medo de ser presunçoso, sabe muito bem quais ferramentas utilizar para tornar essa simples história cotidiana em mais um bom e – para alguns – surpreendente longa argentino.


Destaque sonoro:




 

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