Crítica: Django Livre

Tarantino é um fanfarrão. Entre os diretores da última geração, o queixudo ganhou um destaque justo pelos seus filmes, porém está carregando adjetivos superestimados. Django Livre (Django Unchained, 2012) também é um filme superestimado. Reinando como se fosse o Deus salvador do cinema moderno, Tarantino tem hoje a sétima arte em suas mãos, isso é fato. Poucos hoje podem montar um roteiro sem intervenções de estúdios, escolhendo atores e com tanta gente enaltecendo seu ego. Desse modo ele vem consagrando sua marca e, também, repetindo acertos e erros.

Django não é um filme perfeito, quem dera uma obra-prima. Calcado no gênero western, do qual o cara é fã assumido, temos em Django uma repetição de aspectos clássicos de outras obras, misturadas com aquilo que Tarantino precisa por para dizer que o filme é a sua cara: sangue, vingança e diálogos longos. Django se resume, de certo modo, como uma versão moderna de um faroeste esquecido, consolidando-se mais como homenagem do que como obra autoral. De roteiro presumidamente original, é fácil pegar referências que se somam aos montes em pouquíssimas cenas.

Esta obra reforça uma máxima dos westerns, com a temática da vingança em maior destaque, e busca em Sergio Leone inúmeras referências. Em desuso no cinema moderno, os closes rápidos aos olhos expressivos dos personagens são as primeiras referências. De Três Homens em Conflito (Il Brutto, Il Buono, Il Cattivo, 1966), além de abrir o filme do mesmo modo de Leone em seu clima árido e, em outro caso, também referenciar a cena da banheira, percebemos a construção da narrativa de Django: dois homens que necessitam aliar-se por conta de informações de seus interesses, é assim que Dr. King Schultz (Christoph Waltz) se aproxima de Django (Jamie Foxx), tal qual Blondie (Clint Eastwood) fizera com Tuco (Eli Wallach), na obra clássica.

O personagem de Waltz, embora declarado coadjuvante na trama, carrega mais da metade do filme em suas costas, amarrado na atuação genial do ator, assim como já tinha feito em Bastardos Inglórios (Inglorious Basterds, 2009). A trama se divide em fáceis polos narrativos, e é de entendimento quase didático, Tarantino explica seu roteiro com informações por vezes excessiva. Em Dr. Schultz, acompanhamos a construção do escravo Django como homem social, que aprende a intrometer-se junto aos brancos, evoluindo sua inteligência (aprendendo a escrever) e sua agilidade (melhorando sua mira).

Muito do filme se deve à atuação de Waltz em sua primeira parte, pois Tarantino parece não assiná-lo no primeiro ato. Com violências pontuais e sangue econômico, o início do filme limita-se a introduzir e construir o ex-escravo, sob a premissa da vingança e da recompensa. O que muito se vê é um escape à comédia trágica, quase presente em todas as cenas. Embora as piadas sejam sempre bem-feitas, Tarantino aqui parece exagerar no aspecto, ao passo que se somam piadas e diminui-se o arco dramático de qualquer possível lição de moral aos personagens. A comédia referente à Ku Klux Klan é ao mesmo tempo genial e gratuita no filme.



Nesse sentido, a escravatura, tema emblemático e até pouco retratado no cinema norte-americano, perde sua oportunidade de entrar em cena. Tarantino opta – e é sua opção – pela vingança, novamente, ao passo de que esperamos da trama somente esta abordagem.

Como se montássemos num cavalo, acompanhamos Schultz e Django entre cenas de humor e estratégia de vingança. Os flashbacks iniciais são também desnecessários e fogem bastante à bela fotografia do filme; poderiam ter sido excluídos, uma vez que não precisamos ser lembrados do drama de vida dos escravos, a história e o consenso popular já se encarregam disso.

Contudo o melhor de Tarantino está presente em todas as cenas. O cinema atual demonstra muitos cortes rápidos, ágeis, urgentes e apressados, em geral concluindo cenas também pequenas, de informação única e objetiva, como se estivesse apressada a contar o próximo passo de sua história. Tarantino tem em si a habilidade de poucos para montar diálogos longos, sem ser gratuito em suas informações e construir seu personagem com maior profundidade. Se Django deve ser reverenciado por algo, é pela habilidade destas longas cenas, que caracterizam um diretor de atores, dando a ambos a oportunidade de mostrar seus talentos, assim como ele se consagrou em Pulp Fiction (1994).

A reviravolta da trama apresenta seu vilão, Calvin Candie (Leonardo DiCaprio), e guarda as cenas de maior tensão do filme. No jantar de negócios tem-se um diálogo bem amarrado, construtivo aos personagens e que fecunda a desavença entre protagonista e vilão. É para esta cena que Tarantino guarda o ápice de sua narratividade, com uma estratégia inteligentíssima ao personagem de Waltz. Também é presente a linguagem de expressões e olhares principalmente entre Django, Broomhilda e Stephen (Samuel L. Jackson). O diretor apresenta ali duas conversas simultâneas, acompanhamos a negociação da compra de escravos com foco nas consequentes expressões faciais destes outros personagens.

A sequência final do filme é o maior divisor de águas. Primeiro porque a aparição do diretor em cena é altamente desprezível diante de sua má atuação, que acaba enaltecendo ainda mais seu interesse cômico e até despretensioso à trama. Ao mesmo tempo que o diretor vinha acertando em nível de imersão em todas as cenas longas, bem dialogadas e construtivas, algumas cenas finais poderiam ser mais objetivas em linguagem, resultando num final mais coeso e num filme menos longo. E segundo porque é ali que Tarantino derrama seu sangue, onde podemos ver muito do cinema que já o consagrou.



Outro ponto que divide acertos e erros é a trilha sonora. Os aspectos mais agradáveis se dão no bom humor de várias músicas e construção de trilhas específicas do western, assinadas pelo próprio Ennio Morricone. Assim, o toque do maestro é culminante para músicas bem trabalhadas, reconstruindo as trilhas clássicas, calmas, pacientes e bem agudas. No entanto as duas músicas de rap – ainda que coerentes ao contexto sobre a história negra – poderiam ser descartadas, pois desconstroem o cenário narrativo.

Django Livre, com sua qualidade autoral bem clara, certamente impulsiona a fama de Tarantino pois reafirma a sua linguagem. E os fãs claramente podem dizer: “Esse é um filme tarantinesco”. É a melhor obra do diretor? Questão de opinião. Porém reafirma suas referências a tudo, até a ele mesmo, e vai confirmando que o cara tem um dom correspondente à parte de sua fama.

No cinema, há dois tipos de filme: aqueles que apresentam sua visão sem intervenções, e aqueles que enxergam com os olhos dos outros.
 

Destaque sonoro:




Crítica: Frankenweenie

Em Frankenweenie (Idem, 2012), Tim Burton dá ênfase ao tradicionalismo de sua marca. Como quem parece andar à contramão do mercado, o diretor pouco inova e reafirma que o mundo visual que sempre proporciona é único, assim como a chance de realizá-lo é só sua. Às avessas do mercado de animação, escolhe, ainda, o stop motion para definir a arte de seus novos personagens.

Todo mundo tem uma opinião sobre Tim Burton. A meu ver, o diretor é extremamente eficiente ao conseguir criar um universo único em todos os seus filmes, os quais ninguém consegue igualar, porém nem mesmo ele parece conseguir se livrar. A cada novo filme Burton aumenta um tijolo nesse mundo, prendendo-se à uma temática gótica, com características que para sempre remeterão a seu nome quando algo visualmente similar ocorrer.

Nesse universo, Tim Burton nunca pareceu querer ser um gênio. Nos salta à conclusão que o artista optou por inovar e aprimorar seu apelo técnico e visual para definir seu cinema, muito mais que a possibilidade de um roteiro inovador ou algum personagem muito profundo. Dessa forma, o diretor conseguiu criar uma das técnicas cinematográficas mais marcantes da história do cinema, proporcionando até ao espectador mais leigo a conexão imediata entre obras de sua autoria.

Burton é um diretor supervalorizado pelos espectadores, algo que ele não faz a si. A cada trabalho, o diretor reafirma seu foco no seu lugar-comum, um interesse voltado à possibilitar ao seu público uma nova história com uma mesma sensação, mais do que imergi-lo em algo totalmente inovador. Acima de tudo, Tim Burton quer sempre ser Tim Burton.

Um dos elementos que marcam a sua carreira é a exclusão social de seus personagens, o isolamento e  o medo com algo na sociedade. Este fator infla a possibilidade de Burton casar seus elementos visuais com esta forte característica emocional das suas criaturas. Ao maior exemplo, citamos Edward, em Edward Mãos de Tesoura (Edward Scissorhands, 1990).

É com este entendimento que podemos compreender melhor seu último trabalho, Frankenweenie. Baseado em um seu próprio curta-metragem dos anos 80, o resultado aqui mostrou-se altamente agradável. Obviamente, Burton buscou praticamente recontar a história clássica de Frankenstein (Idem, 1931), clássico do horror literário e cinematográfico, fator que reafirma seu maior interesse em adaptar uma história sob a sua linguagem.

Frankenweenie leva em seu nome parte dessa amarração. Em sua história, lembramos com um ar de homenagem o trabalho que o diretor realiza sugando as ideias de Frankenstein. Temos novamente o cientista, a sala de ciências e o professor, o personagem-título da obra clássica e até o corcunda. Neste novo filme, nosso herói é um cachorro, Faísca, que toma a vida após um experimento científico realizado por Victor Frankenstein - um recluso personagem sem amigos.



A história trata, dessa forma, da experiência científica do cientista em "ressuscitar" seu cachorro, diante de conselhos científicos de seu professor Rzykruski. Victor quer apresentar sua experiência na feira de ciências de sua escola, mas sua ideia é roubada pelos seus colegas e eles entram em altas confusões Faísca, o cachorro, toma a frente para salvar sua vida e provar aos pais de Victor que a ciência pode ser aplicada em prol da vida e da boa convivência.

Àqueles que perderam um pouco de sua esperança nos filmes do diretor, este exemplar mostra-nos eficiente e reconta com as mesmas palavras o sucesso adquirido por Tim Buton, e isso não é necessariamente ruim.

Visualmente, Frankenweenie é um trabalho muito paciente e atencioso. Marcado também por ser em preto e branco, constrói-se com eficiência um belo cenário gótico, alguns personagens misteriosos, e com a velha música clássica dos filmes do diretor. Aqui a experiência é muito válida, um filme que resume-se gostoso de assistir pelo simples prazer do entretenimento. Ainda que facilmente narrado ao público infantil (e lincado à Disney), Burton clama somente por imersão ao seu visual para uma boa sessão de cinema, já que sua história não se compromete a um final surpreendedor.




Crítica: Um Dia de Cão

Quando Sonny (Al Pacino) decidiu sair do carro para cometer o assalto, ele não queria somente o dinheiro. Como solução imediata, somente o roubo já bastava, mas as circunstâncias o deram a chance de tentar resolver seus problemas de modo mais limpo, mais justo. Talvez a vida tivesse se cansado das atitudes incorretas de Sonny, e assim tentou lhe dar a oportunidade de reclamar seus problemas a todos.

Sonny vivia uma vida em pedaços, cheio de problemas familiares e amorosos. Em certo momento, é bem claro que o personagem necessitava gritar ao mundo, como quem perguntasse quais razões as pessoas tinham para julgar suas escolhas pessoais. Essa necessidade que parecia incomodar Sonny foi lhe dada em momento bem apropriado. De um marginal assaltante de banco, Sonny tornou-se, em poucas horas, um astro da TV. Ele tinha o foco em si, uma nação que sentava no sofá com pipoca na mão para ouvir o que tinha a dizer.

Ele era a representação de um problema maior, uma única voz reduzida que na verdade falava por muita gente. Aos gritos de "Attica! Attica!", Sonny clamava por atenção à força desproporcional, onde a polícia havia pago com a vida de cidadãos inocentes para também apagar alguns marginais. Sufocado, o protagonista estava certo de que aquela era a sua hora, e o saldo de sua apresentação deveria ser positivo.

Além da presente atenção que o personagem de Al Pacino conquista no filme, é oportuno perceber como é tratado o oportunismo no filme no que tange outras questões. A TV suga desse fato policial uma alternativa para sua audiência, e transforma o assalto num reality show da vida real. Como retrato de uma peça de teatro, Sonny deve sempre sair do banco para apresentar-se no "palco". A calçada é este palco e o povo comporta-se a sua frente como espectador. Os elementos do filme então nos convencem que trata-se de um jogo de oportunidades. O delinquente, a polícia, o povo e a reportagem.

Um Dia de Cão (Dog Day Afternoon, 1975) vai aos poucos se mostrando com uma narrativa simples e de fácil entendimento, mas bem focado em cenas pontuais. Narrativamente o filme é muito bem estruturado, não precisa de reviravoltas na história e no roteiro para tornar-se dinâmico, o qual é atingido com facilidade por tratar-se de uma situação bem palpável, em que o espectador acompanha o drama sempre imaginando as consequências dos fatos. Nem por isso, contudo, o filme é previsível.

O oportunismo de Sonny detém duas vertentes: a boa, que conquista a chance de ser ouvido, deixando de ser coadjuvante para tornar-se protagonista; e a má, pois a estratégia de negociação do personagem revelam uma deturpação de seu pensamento. No momento que ele propõe trocar reféns por objetos de fuga, ele faz uso das pessoas tanto quanto o fizeram dele até então.



Sonny não é um herói, não é um vilão, ele é simplesmente um alguém. Não somos induzidos a torcer por ninguém, nos percebemos na condição somente de mais um espectador naquele jogo de cenas. Ajudado por seu amigo Sal (John Cazale), os dois vão tomando seus rumos e revelando suas incompetências. Planejaram roubar um banco mas nele não havia muito dinheiro. A adversidade encontrada propõe o mau preparo deles para a situação. Além disso, vemos em belas atuações dos dois atores principais um medo e falta de experiência que propõem os limites da coragem de ambos.

Neste filme policial-dramático de Sidney Lumet, nos sobra, porém, um final que não está a altura do que parecia prometer, talvez muito por estar amarrado à uma história verídica ocorrida em 1972. Vale bem a pena a experiência, no fim das contas o filme mostra um ritmo bem agradável. Ainda que jovem, Al Pacino soma neste papel mais um belo trabalho com a predominância de sua característica um pouco insana. É uma obra bem oportuna que permite algumas conclusões, com um ritmo leve e sem qualquer arrogância para maiores lições de moral.




Artigo: Cinema brasileiro, uma arte desvalorizada

Quando mencionamos o cinema brasileiro, alguns pensamentos urgentes nos parecem assaltar à mente. A recorrente aversão aos filmes de nosso país levanta questões sobre o quão certeiro somos ao desdenhar nossas próprias produções. Afinal, por quais motivos ainda somos um país de qualidade cinematográfica tão inferior às escolas do cinema mundial?

O Brasil é um país cuja característica cultural mais forte é realmente a própria união de culturas e povos. Uma vez que contamos com essa multiculturalidade, não deveríamos ao menos apresentar trabalhos de razoável poder artístico com maior regularidade?

O Brasil discorre, sim, de filmes importantes e de grande poder crítico com notório talento artístico, mas a sua rara ocorrência parece alimentar esse preconceito que temos com o trabalho realizado em nosso próprio quintal.

É certo, no entanto, que a nossa descontentação diante dos filmes nacionais advém de uma comparação imediata aos filmes de grandes estúdios de cinema, os quais importamos com facilidade absurda. Mas por quê não realizamos obras com qualidade similar? Quais motivos nos levam a ser tão esquecidos em premiações da sétima arte?

Uma das grandes competências do povo brasileiro é reconhecer seu talento, sua capacidade de improvisação e superação aos problemas. Partindo deste ponto, concluímos que há um hiato entre este talento e a chance dele ser transformado em arte. É controverso reconhecermos este nosso talento e alimentarmos um preconceito sobre a nossa capacidade produtiva.

Ao passo que tentamos entender a razão para este cenário, concluímos que a maior razão para esta falta de produtividade está na falta de incentivo. Que chance damos aos nossos atores, diretores e equipe técnica para espelharem seu poder crítico em longas-metragens? Quais são nossas leis de incentivo à arte? Quantos projetos significativos possuímos? Constatamos facilmente a ausência deste apoio em filmes nacionais, quando o patrocínio de várias empresas para arrecadação de fundos à realização da obra se faz presente.

Este problema se agrava, ainda, quando vemos que obras artísticas, de cunho autoral e crítico, vêem-se obrigadas a submeter-se à uma arrecadação que deveria vir do próprio governo. Esse problema se estende à nossa escola de atores, à formação e capacitação cênica mal resolvida em nosso país. Como resultado destas questões, saltam-nos como grandes produções do cinema nacional filmes pertencentes às redes de televisão, e fazem de nossos atores novelescos os grandes astros da nossa arte cinematográfica.

Talento.

A qual cinema damos ênfase? Nos shoppings, os quais detém as salas mais populares, percebe-se a quantidade de longas estrangeiros em cartaz. Vendemos um produto que não é nosso. Dos filmes nacionais, quando exibidos nos cinemas, não é irônico mencionar a observância de que a televisão parece simplesmente ganhar proporções da tela cinematográfica. O cinema brasileiro está carente, assim como boa parcela do seu público. O avanço só é percebido quando olhamos para trás e enxergamos menor poder artístico, e para isso é necessário iniciativa para mudar a visão e o apoio a esta cultura.

A subversão destes valores é que deve ser percebida, contestada e alterada. O talento e a arte nacional são vivos, e o povo brasileiro necessita de oportunidade para mostrar seu valor em todas as artes. Não compreendido a natureza do problema, continuaremos a conquistar Copas do Mundo, e a falta de títulos cinematográficos continuará mostrando o foco artístico que alimentamos em nosso país.

Artigo: As continuações continuam


Mais que uma arte, o cinema é uma indústria, assim como qualquer outra. É bem óbvio que por se tratar de uma indústria, temos um cenário padrão de vendas e consumo, e talvez o que incomode tanto algumas pessoas seja aceitar a convivência entre o mundo do interesse e o mundo dos ideais. É bem diferente, sendo assim, relacionar a indústria do cinema e dos games, por exemplo, com uma indústria típica capitalista, onde até se tenta vender uma sensação atrelada a marca, mas nunca se vende o talento e a paixão por um artista.

A arte deve, portanto, ser separada nessa relação de consumo. Assim como todas as outras indústrias, existe uma mescla de interesses, onde se pondera a possibilidade de realizar unicamente uma arte, que é a manifestação livre e aprofundada do pensar, excluso de qualquer interesse mercantilista, com a necessidade de buscar recursos para estas realizações.

Antes de sair esborrachando descontentamentos com as frequentes e contestadas continuações cinematográficas, temos que ter em mente que o cinema também se divide em polos. Se separarmos o que é arte do que é interesse do capitalismo, talvez cheguemos num denominador comum. Os filmes independentes representam essa gama que contesta, que discute e promove o real sentido da arte, e as produções vinculadas à estúdios cinematográficos certamente contam com parcelas de interesses mercantilistas.

Dificilmente este cenário se alterará, porém. Um ponto pertinente à esta avaliação é inverter o foco de estudo: as obras a que nos chegam são um resultado do interesse de quem consome estes filmes, sendo assim, os filmes com receitas de bolo continuam porque sempre fazem sucesso, e suas temidas continuações realmente tem tudo para continuar acontecendo.

Percebemos então um núcleo de pessoas que contesta este cenário, defendendo a sétima arte tal como ela é caracterizada, mas esquece que o que move todos estes cenários é tanto mais forte quanto a própria explicação para que o cinema ainda exista com tamanha influência na sociedade. O número de pessoas que buscam essa linguagem e, profundamente ou não, aprendem com ela, é maior a cada ciclo, e esta força é que alimenta este mercado e o faz acontecer. Cabe ao cinéfilo, no entanto, conhecer estes cenários, aceitá-los, e direcionar seu interesse.

O que tomamos como unanimidade é, todavia, o mercado de filmes norte-americanos que são produzidos à repetida exaustão ao público que ele mesmo teve a competência para criar. O que erroneamente se faz é tomar o mercado de filmes mercantilistas dos EUA como único, esquecendo-se da riqueza que o cinema produz no sentido de arte, mesmo que proporcionalmente muito reduzida.

Dessa arte pura, a qual temos ideias únicas e roteiros que não seguem padrões, percebemos em geral artistas preocupados unicamente com sua linguagem, em geral diretores, produtores e equipe de fotografia. Uma vez que encontramos essa arte crua, nos cabe segui-la, através de seu diretor, seu movimento ou seu país. Ao cinéfilo mais atento, ele sabe que esta arte dificilmente virá até ele através de uma propaganda na televisão, ou sequer uma exibição no cinema de shopping de sua cidade; ele terá que encontrar no boca-a-boca, na internet, naquele cinema alternativo que quase ninguém sabe onde fica na região, porém, ele vai encontrar.

As continuações de filmes não significam, no entanto, que a obra não seja artística ou pouco comercial, são, em sua maioria, apenas constatações de um interesse financeiro, atrelado a oportunidade conquistada com o sucesso de bilheteria do filme inicial. Sendo assim, o quê podemos entender como sequências válidas ou ruins, artísticas ou comerciais, de exemplares como: Jogos Mortais, O Poderoso Chefão, Toy Story, Premonição, Rocky, [REC], Senhor dos Anéis, A Era do Gelo, Loucademia de Polícia, Cheech e Chong, De Volta Para o Futuro, Rambo, Indiana Jones, a Trilogia dos Dólares, Se Eu Fosse Você, Os Mercenários, e tantos outros?

Um filme não deixa de ser artístico quando possui uma sequência, porém a maioria das sequências representam o sucesso de filmes unicamente comerciais. Ao espectador cabe separar o joio do trigo, analisar seu interesse no cinema para encontrar sua linguagem, ao ponto de que seu currículo cinéfilo dependerá unicamente de seus critérios quando for selecionar o próximo filme da prateleira.

 

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